D A M U L H E R O P R I M I D A
João 14.1-14 – Na casa de meu Pai há muitas moradas.
É possível
falar das mulheres também por meio dos poemas que tratam delas nas dimensões
mais profundas do ser libertário, na luta contra o sofrimento da humanidade?
Mudando o tom dos doces poemas e das canções, como aquela da minha juventude: “Não
sei, que intensa magia seu corpo irradia, e me faz sofrer, mulher”, é duríssimo
para a mulher libertária que o preconceito androcêntrico, masculino,
onipresente a exclua da velocidade necessária, nas lutas por direitos humanos,
culturais e sociais. Por exemplo, dentro da Igreja, é preciso tirar as máscaras
da objetividade masculina contra a subjetividade feminina, aparentemente
harmonizadas no culto e no serviço à igreja comunitária.
A presença
visível perceptível, “theofania“, comunicação de Deus em Jesus Cristo, clama
por justiça por meio de relações recíprocas de justiça entre homens e mulheres.
Nada mais forte, nessa teologia, que a medida do humano alcançando o homem e a
mulher. Isso é mais e maior que tudo. Inventa-se, depois, uma forma de domínio
para submeter a mulher ao que se chamaria “patriarcado amoroso”. Sabiamente,
Elza Tamez recusa esse eufemismo sugerindo: “patriarcalismo de amor é uma
denominação que não diz nada, porque não deixa de ser patriarcalismo”.
Mulheres
vestindo a pele do predador não constituem novidade, a exemplo daquela pesquisa
recente sobre o consentimento do estupro (IPEA – Folha de S. Paulo – 14 de abril de 2014). Consequência da
contaminação cultural da qual não se isenta a igreja. Aqui, tantas vezes, com a
mulher fazendo parte, ou pervertida, quando solidária com o explorador e
dominador. Tantas mulheres envolvidas contra a cidadania insurgente, que
reclama a respeito de direitos iguais para a mulher.
A mulher sabe
muito bem o que é “dor de parto”, disse Helen Shüngel-Straumann. Talvez só ela
saiba. Maria, mulher exemplar no Evangelho, dá à luz uma criança que vem para
simbolizar todas as liberdades. Com dor. Sabe que dessas dores não nasce a
morte, mas sim a vida diante de Deus. Vida para toda a Criação, pelo parto do
Salvador. Perigos de guerra, comoções, riscos sociais, violência e opressão,
perseguição por causa da busca de direitos e da liberdade, ocasionam sofrimento
a homens e mulheres, de igual modo. Quando Paulo fala do sofrimento como “dores
de parto” (Romanos 8.18-25), refere-se ao “presente” de todos os seres criados,
porém, na esperança: “um dia o Universo ficará livre do poder destruidor que o
mantém escravo”.
Jesus diz
a seus discípulos que vai partir e isso não deve perturbá-los porque vai para
poder depois levá-los e tê-los sempre consigo, para preparar-lhes um lugar na
casa do Pai, uma “grande casa sem senzala”, onde cabem todos, homens, mulheres,
crianças (João 14.1-12.). Sobretudo os mais pobres, que “nunca tiveram uma casa
própria”, sem-teto; filhos e filhas pródigos e pródigas. Os que desejam
regressar ao acolhimento do Pai. Fiéis que souberam carregar o peso do trabalho
e as cargas da vida encontram repouso. Escorraçados, despoderados, abandonados
pelos poderes humanos e pela religião, têm “uma casa para abrigá-los,
protegê-los, e dar-lhes segurança”. Para chegarem à casa paterna, precisam,
homens e mulheres, de um caminho, de uma lâmpada quando chegar a noite.
O Deus da
gratuidade é exemplar. O Salmo 36 (8-10) expressa com segurança essa certeza: “Ó
Deus, quão preciosa é a tua graça. Os filhos e filhas dos homens e das mulheres
se refugiam à sombra das tuas asas. Saciam-se da abundância da tua casa”.
Assim, homens e mulheres mostramo-nos deslumbrados por esse Deus das muitas
moradas, quedamo-nos perplexos pela grandeza do teto dessas moradas, o céu
estrelado, a amplidão do Universo, o finito confundindo-se com o infinito, a
eternidade da vida, onde está o Reino de Deus e a vida eterna.
Derval Dasilio
Teólogo e pastor presbiteriano
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